Tenha o prazer
de mergulhar no oceano de palavras
e acompanhe toda minha ansiedade
durante meu percurso formativo, nas escritas dos meus Diários de Ciclo no curso de Licenciatura em Pedagogia na UFBA.
DIARIOS: O DESABROCHAR DO
PROCESSO DE ESCRITA NOS CAMINHOS FORMATIVOS
Ao iniciar o Curso de Licenciatura em Pedagogia UFBA/FACED em
Tapiramutá, fiquei ansiosa para saber os conteúdos da grade curricular e tive
uma surpresa, pois o curso não permitiu o uso de um currículo estável, e sim a
cada Ciclo eram apresentadas atividades, que contemplavam os eixos temáticos em
que faziam parte da estrutura do curso.
Assim, a cada ciclo as atividades eram apresentadas, por eixos
temáticos, que permitia aos cursistas escolherem as atividades que consideravam
pertinentes ao seu processo formativo. Por dar liberdade de escolha ao
professor-cursista nas atividades. Deste modo, o curso se configura em caráter contemporâneo
por acreditar que o ser humano tem capacidade de formar e transformar a
sociedade, sem extinção social.
Sendo que o curso, não utiliza as mesmas metodologias abordadas
como em outras instituições de ensino superior em que tem como elemento
principal um tema ou assunto em que o estudante pesquisa e defende, através de questionários, entrevistas, o que
diferencia em nosso curso, que trás possibilidades para o próprio
professor/cursista em construir o processo formativo na intinerância
curricular. Ao perceber isso, valorizei a importância do registro para
formação, foi solicitada a escrita de um Diário de Ciclo.
Então,
anunciado que as atividades de registros seriam
instrumentos e critérios de avaliação do curso, inicialmente fiquei
receosa, principalmente, quando me dei conta que era necessário me expor na
escrita e que outros iriam ter acesso a esse eu mediante o percurso vivenciado, experimentado a cada Ciclo, não tinha o hábito de registrar, tão pouco conhecia
o que era uma linguagem acadêmica. Recordo a escrita do meu primeiro Diário,
sem reflexão, meramente descritivo, contendo apenas três laudas, após receber o
parecer refletir sobre a minha própria escrita, reconheço que não atendi as
exigências acadêmicas.
Rememoro como um filme a escrita do meu Diário de Ciclo Um,
enfrentei dificuldade por não saber como iniciar, relatei as atividades que
considerei pertinentes, não que as outras não foram importantes, mas tem
aquelas que marcam positivamente, desafiadoras, por exigir do cursista o
exercício constante da leitura e escrita. Por falta dessas práticas, meu
primeiro Diário não teve escrita reflexiva, mas é como Zabalza
(1994) salienta que “a atividade escrita arrasta consigo o fato de a reflexão
ser condição inerente e necessária a sua elaboração”. Por falta do exercício,
tanto da escrita quanto de leitura, não realizei escritas reflexivas e com
linguagem acadêmica.
A
cada Diário escrito percebi que necessitava me aprofundar nas leituras e
discussões nas atividades assistidas e vivenciadas, elas me possibilitaram uma
escrita mais concisa apoiada nos estudos através da teorização com a prática
argumentativa e reflexiva, não apenas na mera descrição dos fatos e
acontecimentos entrelaçados com as atividades, presença forte em minhas
escritas, descrição.
Essa forma de
escrever perdurou por alguns ciclos, mas as leituras constantes, minha
perseverança em seguir aprendendo para ampliar minha visão de mundo,
conhecimento enciclopédico era tamanho, por esse motivo passei a ler
constantemente, sendo que, quanto mais se ler, melhor se escreve.
Ao realizar as
escritas dos Diários, percebi que em alguns momentos regredia, em outros eu
avançava, mas estes são os desafios que enfrentei quando me permitir escrever
sobre mim. Sendo que ao escrever conto as aprendizagens já construídas do
cotidiano como também, a ressignificação das mesmas ao longo do Curso.
Algo que contribuiu para a realização dessa escrita foi
meu cotidiano que me possibilitou a interação das atividades vivenciadas com a
minha práxis, em alguns momentos, o discurso de alguns cursistas me preocupava,
ao relatar que, não conseguiam aplicar em sala de aula as atividades
vivenciadas no Curso, sendo que o Curso ofereceu diversas atividades, alguma
delas era especifica para o conhecimento do professor/cursista, outras poderiam
ser aplicadas em sala, mas a visão de alguns cursistas eram transpor tudo que
aprendiam no curso. Ao pronunciar que o Curso não tem essa proposta, alguns
cursistas discordaram, por acreditar na transposição dai a ruptura estava
posta.
Mais uma vez,
ressalvo a proposta do curso com uma gama riquíssima de atividades. E, de todas
as atividades oferecidas, tive o privilégio de me deliciar a elas e, uma que teve
grande relevância foram os GELIT[1]
porque me possibilitou reconhecer a importância que a leitura tem como elemento
impar no meu percurso formativo e pessoal. Nessa atividade tive a chance de
viajar, debruçar, rir, chorar, ler por deleite, por obrigação, enfim, tomei-a
como desafio para aperfeiçoar meu conhecimento enciclopédico e os diversos
contextos literários.
No
Ciclo Dois, essa vontade e beleza literária me aguçaram o interesse em conhecer
mais, me inscrevi novamente na atividade GELIT por reconhecer que ler era uma
grande dificuldade, então tomei como um desafio o ato de ler. Realizei a
leitura do livro Vidas Secas, de Graciliano Ramos.
A
leitura desse livro me fez mergulhar na reflexão sobre minha história de vida, devido ao contexto se aproximar da
minha realidade. Em que o cenário nordestino, traduz em muitas realidades a
desigualdade social, e traço um paralelo a cena em que mostra nitidamente a
preocupação da mãe em alimentar os filhos, situo-me neste contexto em que a
minha família também passou por essas situações em alguns momentos. Essas cenas
me levam a valorizar as pequenas coisas da vida.
Os
estudos literários eram realizados semanalmente, nesses encontros eram
discutidos os contextos sociais e políticos em que os autores protagonizavam
suas narrativas, confesso, não gostava de ler, nos primeiros GELIT me inscrevia,
por conta da carga horária, mas após realizar os estudos percebi a importância
da leitura para minha formação. Não tinha como não aprender a gostar de ler, sendo
que as atividades oferecidas no curso exigiam leituras, tive duas alternativas:
ler ou ler.
No
Ciclo Três, o desejo de seguir aprendendo, não mudou, compreendo que a
aprendizagem é um processo gradativo, que requer tempo interação, como afirma Vygotsky
(1987) na teoria sociointeracionista é
necessário à interação para que haja aprendizado, comigo não foi diferente a
cada Ciclo ampliava meu repertório e, meu conhecimento.
Nesse
Ciclo participei de várias atividades que me ajudaram a responder algumas
perguntas; Quem sou? Quem são as pessoas? Qual minha importância na sociedade?
Com a leitura do livro: Uma Aprendizagem ou Livro dos Prazeres, Clarice
Lispector, encontrei respostas de algumas dessas questões. E, ao mesmo tempo
surgiam outras, não era novidade, uma vez que os seres humanos convivem com
várias indagações, às vezes levamos anos para descobrir quem realmente é ou se
vivemos com máscaras que escondem nossa própria identidade.
Assim,
como Lori protagonista do livro, que, só conseguia conversar com quando usava maquiagem,
para ela, esse ato, no sentido figurado era sua máscara, sendo que, cobrir seu
rosto transformava-a em outra pessoa. Sua postura me leva a refletir e
questionar: Quantas máscaras usamos para resolver nossos problemas? Conseguir
os nossos objetivos?
Ao
término da escrita do Diário de Ciclo Três ao receber o parecer, ficou visível
que minha escrita na questão de conteúdos teve avanço, mas persistiam alguns
erros, um deles parecia ter criado raízes em mim, as descrições de detalhes e
as marcas da oralidade. Para superar essa dificuldade foi necessária muita
leitura e escrita constante.
Lembro que no Ciclo Quatro, as minhas escritas ganharam outra roupagem e
linguagem acadêmica. Passei a escrever de forma reflexiva, apropriando-me do
conhecimento enciclopédico, que adquiri no percurso do curso de Licenciatura em
Pedagogia, sendo que, pensar acerca das minhas escritas não é fácil, exige uma
lógica de sentidos e compreensão de mim enquanto escrevo, e ao mesmo tempo
pensar no leitor de minhas produções escritas ou imagéticas.
Mesmo com os
avanços que tive na escrita dos Diários de Ciclo, ainda permaneceu: escrevia
meus Diários no coletivo, não me colocava no texto, narrava os acontecimentos
de forma coletivizada ao Curso, ate então não tinha a consciência que o leitor
necessitava de informações que o situassem em minhas vivencias. Ao receber os
pareceres finais, percebi que essa característica na escrita permanecia.
Apropriei-me dos conhecimentos adquiridos, a partir dos pareceres comecei a
realizar escritas concisas em que minhas experiências estavam postas de forma
singular, com uma diversidade de conhecimentos vivenciados e
experimentados. Então, compreendo a
necessidade de reconhecer minhas possibilidades e valorizar meus saberes na
experiência das escritas dos diários.
Através dos saberes da experiência que, de alguma forma,
nos formaram, formam e continuam inferindo em nossas práticas cotidianas,
levando-nos a refletir sobre a prática em busca de constantes ressignificações
e novas aprendizagens.
Assim, a experiência de narrar os Diários de Ciclo, como o registro que, é uma
possibilidade de aperfeiçoar minha escrita, representar as angustia
expectativas e minha atuação através de um objeto correto. Registrar os diários
de ciclo é como entrar num labirinto de palavras, em que muitas vezes mim perdi
e me encontrei, retornando ao eu.
Portanto, o
ato de registrar é um processo árduo, mas necessário para me fazer pensar
acerca do meu percurso formativo, além de tornar-me uma professora reflexiva,
consciente de minhas ações. Sendo assim, no momento em que transcrevo as
aprendizagens adquiridas, penso e reflito sobre as mesmas, o exercício de observar/escutar
é um dos princípios do registro. O
registro não deve ser encarado como apenas uma tarefa exigida por alguém ou
instituição, mas sim uma rotina do ser professor.
Experiência
comprovada, pois ao relê meus primeiros Diários, e ao realizar a leitura dos
últimos a diferença foi visível, principalmente nos aspectos reflexivos e
ortográficos, a frustação que tive no inicio do Curso ao saber das escritas dos
Diários foram superadas. Hoje reconheço o quanto essa atividade contribuiu para
o meu exercício e crescimento tanto pessoal quanto profissional.
REFERÊNCIA:
LISPECTOR,
Clarice. Uma aprendizagem ou O livro dos prazeres. Rio de Janeiro:
Rocco, 1998.
VYGOTSKY,
L. S., Pensamento e Linguagem. São
Paulo: Martins Fontes, 1987.
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